quarta-feira, 15 de junho de 2011

O “Calor Humano”

O “Calor humano” é uma expressão que se utiliza no nosso dia-a-dia e significa afectividade/afabilidade entre as pessoas. Pode ser considerado terapêutico e aliado com a honestidade, sinceridade melhora toda a comunicação humana estabelecendo laços entre os indivíduos. Também faz com que as pessoas troquem entre si histórias de vida, experiências e ensinamentos. Quem é rico de “calor humano” é uma pessoa afável, querida e bem-disposta.
Neste sentido, o “apoio caloroso da família” tem um efeito de bem-estar directo nos utentes. Ao longo do tempo os estudos realizados neste sentido, concluíram que os cuidados genuínos e calorosos têm sido associados a um aumento da esperança dos utentes com Cancro (koopmeiners e tal, 1997).
O “calor humano” é também extremamente importante entre colegas de trabalho. Grande parte da população ocupa a maior parte do tempo no local do trabalho, logo é importante “catalisar relações”, criar um ambiente de crescimento mútuo, promovendo a proximidade. Todavia, traz benefícios não só a nível pessoal como a nível profissional podendo mesmo ter aumento na produtividade de um serviço.
Levine e Adelman (1982) realizaram estudos nos Estados Unidos e concluíram que 93% das mensagens são transmitidas pelo tom de voz e pela expressão facial e só 7% por palavras. É importante estarmos atentos à forma como comunicamos. Muito do que comunicamos é por linguagem não verbal, mensagens simples como os músculos relaxados e a testa lisa, contacto visual confortável mostra uma atitude calorosa de atenção para com as outras pessoas.
Na mesma linha de pensamento, a expressão facial de uma pessoa é extremamente importante na comunicação, mostra muitas vezes o estado de espírito, transmite informações acerca da personalidade, interesses, compreensão com os outros, podendo abrir ou fechar uma conversa.
Os gestos calorosos nem sempre têm o mesmo significado universal. A interpretação do piscar dos olhos ou gesto da mão pode não ser considerados calorosos por quem recebe ao contrário da intenção de quem os enviou.
O “toque terapêutico” pode funcionar como uma forma afectuosa e simples de transmitir “calor humano”. Pode ser com um simples toque no ombro, um abraço, uma mão estendida, um pequeno gesto “vale mais do que mil palavras”. Contudo se for utilizado de forma excessiva pode ter o efeito contrário provocando incomodo e embaraço.
Podemos também transmitir calor humano através da nossa voz. Um tom suave, harmonioso, modulado com palavras “doces” transmite mais calor do que um tom agressivo e grave.
Em suma, o calor humano é um atributo humano indispensável ao nosso dia-a-dia. Quando se transmite calor humano com verdade e sentido estamos a demonstrar atenção e interesse a quem nos rodeia.
   Enfermeira Catarina Santos

terça-feira, 7 de junho de 2011

Cuidados Paliativos

A esperança média de vida tem vindo ao aumentar ao longo do tempo. Actualmente em Portugal, de acordo com a Direcção Geral de Saúde em 2000/2001, ela era, à nascença de 76,9 anos - 73 anos para o sexo masculino e 80,03 para o feminino. Contudo, o facto de se viver mais tempo não garante que se viva com qualidade de vida.
 Houve nos últimos anos uma evolução exponencial a nível tecnológico, a busca da “ cura” foi intensificada, e formou-se a cultura de “ negação da morte”. A morte é encarada como um” fracasso da medicina” e não é vista como um fenómeno natural.
A própria doença terminal tem normalmente relacionado um conjunto de problemas – não só físicos – que acarretam o sofrimento de intensidade diferente para aqueles que a vivem. A resposta a estes problemas, a esse sofrimento passa pelos cuidados paliativos.
 Sendo assim, em 2002 a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu cuidados paliativos como “ uma abordagem que visa melhorar a qualidade de vida dos doentes – e suas famílias – que enfrentam problemas decorrentes de uma doença incurável e com prognóstico limitado, através da prevenção e alívio do sofrimento, com recurso a identificação precoce e tratamento rigoroso nos problemas não só físicos, como a dor, mas também nos psicossociais e espirituais”.
O termo paliativo deriva do latino “ pallium”, que significa manto, capa. Nos cuidados paliativos, os sintomas são “encobertos” com tratamentos cujas finalidade primária e exclusiva consiste em promover o conforto do paciente tanto quanto possível. Os cuidados paliativos, todavia, estendem-se para além do alívio dos sintomas físicos, eles procuram integrar os aspectos físicos, psicológicos e espirituais do tratamento, de modo que os doentes possam adaptar a sua morte iminente de forma tão completa e construtiva quanto seja possível.
Os cuidados paliativos são cuidados de saúde preventivos: previnem maior sofrimento, motivado por vários sintomas (dor, fadiga, dispneia, vómitos, confusão), pelas múltiplas perdas (físicas, psicológicas e outras), associadas à doença grave e terminal, e reduzem o risco de lutos patológicos. Devem assentar numa intervenção interdisciplinar em que a pessoa doente e família, são o centro gerador de decisões de uma equipa que, idealmente, integra médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais. O que esta equipa pretende fazer é intervir activamente naquilo a que a pessoa doente manifesta ser para ela uma fonte de sofrimento. Nessa medida, convém relembrar que os doentes em fim de vida não sofrem apenas pelos sintomas físicos, mas por muitos outros aspectos.
Os cuidados paliativos assentam em quatro pilares fundamentais:
·        Saber controlar os vários sintomas que os doentes apresentam (e não apenas a dor), utilizando medidas farmacológicas e não farmacológicas.
·        Saber comunicar adequadamente com o doente e a sua família, usando obrigatoriamente estratégias para a promoção da sua dignidade.
·        Prestar o apoio à família, detectando os seus problemas, as suas necessidades, mobilizando também as suas mais-valias e ajudando-a a lidar com as perdas, antes e depois da morte do doente;
·        Saber trabalhar em equipa interdisciplinar, integrando o trabalho dos diferentes profissionais de saúde e voluntários, todos devidamente treinados, para dar resposta às múltiplas necessidades dos doentes e seus familiares.
Existem inúmeros utentes e famílias que necessitam de Cuidados Paliativos, uma vez que “(…) não são só os doentes incuráveis e avançados que poderão receber estes cuidados. A existência de uma doença grave e debilitante, ainda que curável, pode determinar elevadas necessidades de saúde pelo sofrimento associado e dessa forma justificar a intervenção de cuidados paliativos (…)” (APCP, 2006-b:4). Incluem-se no grupo de destinatários dos Cuidados Paliativos pessoas que apresentam:
·        Cancro;
·        SIDA em estádio avançado;
·        Insuficiências de órgão avançadas (cardíaca, respiratória, hepática, renal);
·        Doenças neurológicas degenerativas e graves;
·        Demências em estádio muito avançado.

Muitos utentes necessitam de ser acompanhados durante semanas, meses ou, excepcionalmente, anos, antes da morte, como tal, deve-lhes ser oferecida a possibilidade de receberem cuidados de saúde activos, rigorosos, que combinam ciência e humanismo, num ambiente apropriado, promovendo, desta forma, a protecção da sua dignidade.
        Enfermeira Catarina Santos                                                         

sábado, 4 de junho de 2011

Espiritualidade: Um aspecto essencial nos Cuidados de Saúde

Nos dias de hoje, com a evolução tecnológica e com o melhoramento dos cuidados de saúde, tem-se verificado que a pessoa tende a ser atendida preferencialmente para a sua dimensão física, por vezes considerando-se o utente como um misto de sintomas, minimizando a atenção para os aspectos espirituais. Efectivamente, o ser humano representa muito mais do que um conjunto de órgãos, músculos e ossos. Na verdade, cada indivíduo é um ser único e original, que funciona num conjunto de variáveis físicas, psicológicas, sociológicas, culturais e espirituais. Esta visão holística da saúde é o cerne e o centro da prática de enfermagem.
            A palavra espiritualidade deriva do latim spiritus, que se refere ao vento e à respiração, designando algo que está no centro de todos os aspectos da vida de uma pessoa (Dombeck, 1995). De acordo com o autor Carson (1989), a espiritualidade é a consciência do “eu” mais íntimo e um sentimento de ligação a um ser superior, à natureza ou algo superior a si mesmo (Reed, 1987). Por tal, a espiritualidade é essencial para o bem-estar do indivíduo, pois é uma dimensão na qual o ser humano se transcende e encontra um sentido para a sua vida.
É comum confundir-se o conceito de espiritualidade com religiosidade. Estas duas dimensões surgem, por vezes, associadas, na medida em que a religião pode constituir uma forma de expressão da espiritualidade de uma pessoa. De facto, a maioria das pessoas satisfaz as suas necessidades espirituais recorrendo à prática religiosa, reconfortando-se através dos rituais e da crença. Todavia, é possível atingir um bem-estar espiritual sem recorrer, necessariamente, a rituais religiosos. A espiritualidade deve ser encarada como algo que transcende as dimensões físicas e psicossocial, dando um sentido para a vida. Um exemplo de espiritualidade poderá ser a necessidade de encontrar sentido para algo que está a acontecer ou que já aconteceu.
Ao longo do tempo, têm sido realizadas diversas investigações acerca da associação entre espiritualidade e saúde. O facto de um indivíduo acreditar numa força superior, sentindo-a como um apoio, pode ter influência na saúde. Turney e Clancy (1986) estudaram utentes com lombalgias crónicas (dores de costas) e concluíram que um maior recurso à oração e à esperança estavam associados à diminuição da intensidade da dor. A investigação também demonstrou que a meditação proporciona bons resultados no tratamento de dor crónica, insónia, ansiedade e depressão. Humphreys, no ano 2000, verificou que o sofrimento de mulheres vítimas de violência doméstica diminuía com a variável pessoal de espiritualidade.
Concluiu-se, através das investigações efectuadas ao longo das últimas décadas, que existe uma forte ligação entre mente, corpo e espírito. As crenças e expectativas de uma pessoa podem ter efeitos no seu bem-estar físico. Muitos destes podem estar associados com as funções hormonais e neurológicas. Tem-se verificado que exercícios de relaxamento e visualização guiada, por exemplo, melhoram a função imunológica do indivíduo e que o riso aumenta o limiar da dor, reforçando os anticorpos e aliviando tensões.
Sendo assim, é de primordial interesse atender, de uma forma contínua e eficaz, às necessidades espirituais dos utentes e das suas famílias, de forma a proporcionar os resultados pretendidos em termos de saúde.
        Catarina Santos, Enfermeira

Todos nós convivemos com o Luto

Todo o indivíduo ao longo da sua trajectória de vida convive com perdas. Perdas essas que podem ser objectos, sonhos, projectos, pessoas, animais etc. Há quem compare a nossa vida a uma viagem de comboio com embarques e desembarques, perdas, conquistas e sonhos. Algures na nossa caminhada somos obrigados a despedirmo-nos de quem mais amamos, de quem nos marcou significativamente, ficando para sempre gravados no nosso coração.
A perda é uma mudança significativa e inclui um estado de privação de alguém, de uma coisa tangível (determinado cargo de emprego, uma casa, um carro), ou de qualquer coisa intangível (representações mentais, projecto de vida, esperança de fazer determinada viagem), desencadeando uma cascata de sentimentos, reacções afectivas, cognitivas e comportamentais levando ao processo de luto. Todavia, cada pessoa enlutada é um ser único, cada perda tem um significado específico para cada pessoa em cada fase da vida ou da doença.
Segundo Twycross, o luto é das experiencias mais dolorosas, causadoras de maior crise pessoal, tendo consequências para um número elevado de pessoas. O luto não é apenas emocional, é também uma experiencia física, intelectual, social e espiritual. Afecta sentimentos, os pensamentos e o comportamento. Uma grande perda obriga as pessoas a adaptarem as suas concepções sobre o mundo e si próprias. É um processo de transição.
O luto é universal, contudo depende de cultura para cultura a forma como se vive, como Africa do Sul o luto é vivido com alegria, fazendo-se o funeral como uma festa e convívio. Na nossa cultura, o luto é vivido com intenso sofrimento e as pessoas normalmente vestem-se de preto.
A maior parte das pessoas faz o seu luto com a ajuda da sua família e amigos, sendo o apoio psicológico uma grande ajuda ao longo deste processo. É importante que se tenha alguém para falar, desabafar e exteriorizar as emoções e sentimentos vividos. Em Portugal existe uma associação de apoio a pessoa enlutada, designa-se associação “APELO”.
Normalmente ao longo do processo de luto o homem depara-se com três fases fundamentais: Choque/negação; desorganização/desespero e reorganização/recuperação.
 Segundo Barbosa (2010) A fase de Choque/ Negação é normalmente a fase em que a pessoa entra em estado de choque, entorpecimento e negação, podendo alternar com intensa dor mental e lamentações.
A segunda fase caracteriza-se essencialmente por problemas afectivos como choro intenso, tristeza, inquietação, culpa, remorso, protesto, ressentimento. Quanto aos sintomas cognitivos, verifica-se preocupações e recordações recorrentes, sentimento de “pertença” do falecido, dificuldades de concentração. Também é comum ocorrerem problemas existências/espirituais como desespero, perda de finalidade, sentido de vida, ausência de desejo de continuar a viver. Por fim, podem existir problemas somáticos como cefaleias (dor de cabeça), problemas digestivos, palpitações, visão disfocada e comportamentais como conduta alterada, desejo intenso de retorno do falecido e isolamento social.
A terceira fase é essencialmente caracterizada por reconhecer a perda na realidade, limitar papéis antigos, reajustamento ao “novo” mundo verificando-se a aquisição de novos papéis, voltar ao trabalho, redescoberta de significado, bem como desenvolvimento de nova identidade.
Em suma, o processo de luto é um processo único, cada um vive de acordo com a sua personalidade e experiências muito próprias. A pessoa enlutada vive um processo contínuo. Para muitos a experiência mais dolorosa da sua vida.
Enfermeira Catarina Santos